Faltando um pouco mais de um mês para o fim do prazo para a emissão do título eleitoral, Campinas soma apenas 3,3 mil eleitores com menos de 18 anos que possuem o documento de votação para as eleições deste ano. O dado é do TRE (Tribunal Regional Eleitoral), atualizado até o final de fevereiro.
O número revela um baixo percentual de adolescentes da cidade interessados nas decisões políticas do país. Segundo o Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados) a população de 16 e 17 anos projetada para o município de Campinas, em 2021, era de 26.579 habitantes. Ou seja, considerando o estimado de jovens, apenas 12,5% são eleitores na cidade.
Vale lembrar que todo jovem que completa 16 anos até a data da próxima eleição (outubro deste ano) pode tirar o título de eleitor. A obrigação do documento, no entanto, é necessária somente a partir dos 18 anos.
PRAZO
O fechamento do cadastro eleitoral ocorre no dia 4 de maio. O prazo vale para os que desejam solicitar a emissão da primeira via do título, transferência de local de votação, além de alteração de dados pessoais ou revisão para a regularização de inscrição cancelada.
O processo para tirar o primeiro título pode ser feito pela internet, de forma rápida e simples. Veja o passo a passo aqui.
BAIXA PARTICIPAÇÃO
Para o professor universitário e cientista político Paulo de Tarso Silva Santos, um conjunto de fatores explica o baixo número de adolescentes com título de eleitor, entre eles uma desconfiança de que a participação na política resulte em mudanças.
“Todo jovem nessa faixa etária tem uma chama revolucionária, um desejo de transformação, mas essa chama às vezes fica apagada ou limitada à medida em que ele passa a refletir sobre os resultados e reais transformações que aconteceram nos últimos anos”, disse o professor.
Na análise do cientista político, desde os movimentos de 2013 com os protestos apoiados por estudantes que causaram reflexos na situação política brasileira, até as mudanças de governos, os jovens começaram a perder exemplos e passaram a não acreditar mais na relevância da participação em voto.
“O jovem está vendo que há uma disputa ideológica, ao mesmo tempo que vê a sociedade presa a problemas sociais que ele tem pouco ou quase nenhum conhecimento. O ambiente escolar também deteriorou muito ao longo dos últimos anos, com negacionismo, e isso influencia muito na forma de reação da juventude, então há uma descrença com a política e com quais seriam os reais resultados do voto, de a que ponto o direito seria suficiente para mudar e fazer transformações que ele anseia”, explicou.
Desde o começo do ano, campanhas promovidas pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) buscam aumentar o número de jovens eleitores. O TSE registrou, no mês de fevereiro, o menor número de adolescentes de 16 e 17 anos com título de eleitor da história. Foram contabilizados mais de 830 mil jovens com o documento até o momento.
“Não é por falta de esforço dos tribunais eleitorais, as campanhas estão em andamento, mas esses apelos não foram suficientes para reverter esse quadro de desconfiança desses jovens. Não é que ele tem apenas dúvida, mas desconfia, ele sempre vai fazer cálculo ‘o que eu ganho com isso?’ e ainda não tem essa percepção de que vale a pena”, completou Tarso.
IMPORTANCIA DA PARTICIPAÇÃO
Apesar das campanhas, Ana Caroline Lopes Lemes, que completou 18 anos no último mês, conta que deixou de fazer o título e votar nos últimos anos por falta de orientação.
“Nunca me orientaram a fazer um título quando tinha 16 e 17 anos, ninguém nunca me falou como fazer, então como nunca teve essa ponte eu não sentia necessidade de tirar”, relatou.
Agora com a obrigação de participar, ela enxerga como era e é importante o voto para ajudar a decidir o futuro do país.
“Eu entendo a minha importância na eleição. Agora eu já fui atrás de tirar o título e vou votar. Eu vejo que é muito relevante e deveria ter feito antes, e agora falo para amigos, colegas, mesma coisa que votar em branco, que não concordo”, afirmou, contando que já está acompanhando os candidatos em redes sociais para escolher o melhor voto.
A importância do voto também é percebida por Maria Eduarda Penachione Fernandes, que com 17 anos já tirou o título ano passado, e vai votar neste ano.
“Eu acho que vai ser responsabilidade muito grande. Tivemos uma pandemia e agora o voto é de grande responsabilidade, é um grande poder nas mãos de quem vai votar e estou com bastante expectativa”, contou.
Duda, como prefere ser chamada, é uma das presidentes do grêmio estudantil da Etecap (Etec Conselheiro Antônio Prado), e já entende a importância da participação também por causa das ações em escolas.
“Pra quem é jovem a gente é visto muito como o futuro, tem muita cobrança da gente ser responsável em levar o país para um lugar melhor, então quando a gente se integra, faz o título, se vê como cidadão, é muito importante que seja levado a sério. E não adianta não fazer, deixar na mão das pessoas mais velhas, que não representam a gente”, acrescentou.
FALTA DE PERSPECTIVA
Para a estudante, o baixo número de adolescentes sem o título também pode ser reflexo da falta de perspectiva atual dos jovens.
“Eu acho que tem um pouco de preguiça, mas também acho que por ter passado por anos tão difíceis, por que perdemos anos pra pandemia, não conseguimos nos enxergar numa sociedade. Muitos de nós (jovens) ficaram em um computador, em um quarto. Perderam a vontade de fazer as coisas, e a pandemia fez esquecer que temos esse poder”, disse ela. Ela explicou também que grêmio da escola tem incentivado os estudantes da Etecap a tirarem o título o quanto anos.
O mesmo motivo também é observado por Ana Clara Carneiro Cunha, que acabou de completar 16 anos nessa semana, mas já decidiu que vai tirar o título.
“Eu estava esperando completar 16 para ir atrás e votar nesse ano. Comecei a estudar os candidatos e faço questão. Eu acho que o baixo número é por falta de acreditar. Tem muitos adolescentes engajados e que acompanham a vida política, mas muitos não estão ligando, acham irrelevante”, opinou.
Sobre a importância do voto, o cientista político Paulo Tarso deu último recado.
“É fundamental que essa juventude participe, porque o que está em jogo também é qual modelo de educação que vai se definir. Se esse jovem se afasta, transfere cada vez mais a possibilidade de mudança, de um problema que vai afetá-lo. É fundamental que vote, independentemente do nível de maturidade, porque essa maturidade vai se adquirindo na medida que se descobre que votar é fundamental não só pra quem vota, mas para toda a sociedade”, finalizou.