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CotidianoCom 100 anos, Santuário do Seu Tranca Ruas das Almas chama atenção no Cemitério da Saudade

Com 100 anos, Santuário do Seu Tranca Ruas das Almas chama atenção no Cemitério da Saudade

Erguido em espaço doado há cerca de 100 anos no cemitério de Campinas, local concentra história, fé e luta contra intolerância religiosa

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Daiimom Ruas se dedica à manutenção do santuário e da imagem do Seu Tranca Ruas (Foto: Arquivo pessoal/Daiimom Ruas)
Daiimom Ruas se dedica à manutenção do santuário e da imagem do Seu Tranca Ruas (Foto: Arquivo pessoal/Daiimom Ruas)

Considerado um marco histórico e arquitetônico, o Cemitério da Saudade, em Campinas, possui, entre os milhares de túmulos espalhados por suas 112 quadras, obras que simbolizam e marcam diferentes religiões e épocas ao longo de seus 142 anos. Entre eles, está uma construção com cerca de 100 anos e que chama a atenção por representar uma importante entidade da umbanda.

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Localizado na quadra 17 e erguido entre sepulturas com estilos semelhantes entre si, o Santuário do Seu Tranca Ruas das Almas se destaca não só pela cor preta ou por não se tratar de uma sepultura, mas também por ser o único lugar de devoção ao guardião erguido dentro de um cemitério no Brasil. E a história do espaço reúne fé, dedicação, respeito e luta contra a intolerância religiosa.

Responsável por manter o santuário há pelo menos 35 anos, o sacerdote e restaurador de arte sacra, Daiimom Ruas, conta que a sepultura na qual foi erguida a homenagem foi doada no início do século XX por um senhor devoto que nunca teve o nome divulgado e que teria tido um pedido atendido por Seu Tranca Ruas. Desde então, o abrigo sobre a cova vazia mudou por duas vezes.

“Esse senhor comprou o espaço e fez uma casinha. Mas ninguém sabe o nome e nem exatamente a história. Mas foi ele que levantou a primeira casinha. Aí esse espaço foi sendo usado e há 35 anos atrás eu comecei a cuidar, a cimentar e a pintar. Até que um tempo atrás eu conversei com o responsável pelo cemitério e ele nos arrumou dois pedreiros para fazer a segunda casinha”, relembra ele.

O SANTUÁRIO ATUALMENTE

Depois de usar cimento, tijolos e outros materiais doados para a reforma, que ampliaram o tamanho do santuário e aumentaram o espaço para oferendas e velas, uma celebração em 2016 reuniu cerca de 350 pessoas e 40 terreiros de umbanda e candomblé no local. Porém, mais alguns anos se passaram até que a área se tornasse o que é hoje. A construção, feita com paralelepípedos, saiu do papel em 2020. 

Com altura suficiente para se confundir com os diversos mausoléus distribuídos pelo Cemitério da Saudade, o santuário não tem janelas, mas a sua fachada ostenta um portão de ferro com adornos característicos na cor preta e dourada. Ao redor, a cor preta predomina pelo piso e por uma base específica para oferendas e velas. Mas é do lado de dentro do abrigo que a imagem é mantida.

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Em pé no altar, Seu Tranca Ruas é representado sem camisa, com uma calça preta com um molho de chaves e coberto por uma capa preta e azul. Com um anel em cada mão, a representação ainda o mostra segurando uma cartola azul e preta e usando um colar no pescoço. Na base, há espaço para uma taça de conhaque e uma vela, assim como caveiras, enfeites e detalhes em dourado.

TELA, VIDRO E CÂMERA

Mas para quem frequenta o local há anos, uma mudança nos últimos meses chamou a atenção: a imagem, que antes era mantida sem proteção dentro do abrigo, atualmente é protegida por uma cúpula de vidro. À frente da proteção, no entanto, o portão também conta com uma tela entre os vãos. E o motivo é óbvio: evitar que vândalos atirem objetos e danifiquem e sujem a imagem de resina.

PRECONCEITO

Questionado sobre o caso de ataque por intolerância religiosa mais recente, em outubro de 2022, Daiimom Ruas conta que precisou usar de sua fé em Seu Tranca Ruas para enfrentar a situação que o obrigou a retirar a estátua do santuário mais uma vez. O ataque foi feito com tinta branca e fezes. Além da fachada, a imagem foi afetada. Ninguém foi responsabilizado, mas o fato fortaleceu Ruas e o grupo responsável pelo local.

“Caí de joelhos e falei ‘Seu Tranca Ruas, me dá força, energia, sabedoria e respeito. O que eu faço agora?’ Peguei, levei para casa, restaurei inteirinho e troquei a capa. A pessoa que fez a imagem em resina emborrachada ajudou. E parece que, do vandalismo que fizeram, mostramos mais o valor dele”, relembra, citando que o espaço do santuário foi limpo e repintado rapidamente.  

Todo o passo a passo da recuperação foi registrado em imagens. Depois de restaurada pelas mãos do cuidador, Seu Tranca Ruas estava pronto para voltar para seu abrigo no cemitério. E o retorno não poderia ser mais especial: em um andor e com direito a uma procissão acompanhada por dezenas de pessoas. Depois disso, a atenção foi redobrada e uma câmera foi instalada no santuário.

“Foi colocada uma câmera lá dentro e estamos pedindo a ajuda da Setec (Serviços Técnicos Gerais) e do Condepacc (Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas) para colocar uma câmera externa”, revela ainda Ruas.

Suja após ataque, imagem foi retirada do santuário para ser recuperada (Foto: Arquivo pessoal/Daiimom Ruas)
Suja após ataque, imagem foi retirada do santuário para ser recuperada (Foto: Arquivo pessoal/Daiimom Ruas)

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RECONHECIMENTO E PRESERVAÇÃO

O pedido à Setec e ao Condepacc (Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas) revela uma parceria que se ampara no respeito mútuo. Os contatos entre os representantes do município e os responsáveis pela manutenção e a limpeza do Santuário do Seu Tranca Ruas das Almas são frequentes. A relação é reconhecida pela Setec (leia a nota abaixo) e o diálogo com o Condepacc pode fazer o espaço se tornar patrimônio cultural da cidade.

Mas enquanto espera pelo reconhecimento da Prefeitura e de ter uma data oficial no calendário da cidade, Ruas não tira o foco do cotidiano de limpeza e visitas ao santuário. Além dele, uma mãe de santo e voluntários também cuidam do local. A meta atual é deixar tudo pronto para a 7ª Homenagem e Saudação ao Senhor Tranca Ruas, marcada para acontecer às 9h do dia 16 de julho.

Perguntado sobre como é a rotina no local, inclusive, pede aos visitantes, adeptos e seguidores da religião e do guardião que respeitem o entorno e o abrigo da imagem, já que é comum fixarem velas na tela do portão e deixarem alimentos como oferendas. Sobre isso, o pai de santo pontua que há um espaço próprio para velas e presentes do lado direito do santuário, em uma base.

QUEM É SEU TRANCA RUAS?

Seu Tranca Rua das Almas é uma das entidades mais antigas e cultuadas na umbanda. A figura dele é representada muitas vezes como um homem sábio e poderoso que atua como guardião e protetor dos caminhos. Por esse motivo, é comum que aqueles que o cultuam peçam para que ele cuide das decisões e escolhas e os ajude a cuidar dos passos dados em vários aspectos da vida.

A entidade é um Exu, figura responsável pela limpeza astral dos caminhos. A linha “das Almas”, inclusive, é considerada uma falange para algumas vertentes da umbanda. A entidade também integra o panteão da quimbanda e alguns terreiros do candomblé também costumam louvar Seu Tranca Ruas.

O QUE DIZ A SETEC?

Em nota enviada ao acidade on Campinas, a Setec informa que “mantém contato institucional com os mantenedores” do santuário “através do senhor Ruas e do Babalorixá Geizo de Sango, que é o presidente regional da Acoucai (Associação das Comunidades Tradicionais e de Cultura Popular Brasileira)”.

Conforme o texto divulgado pela assessoria, os mantenedores, assim como os frequentadores, têm uma convivência saudável e cordial com a autarquia.

“A diversidade religiosa representa a liberdade religiosa dos indivíduos e a valorização de todas as manifestações. A Constituição Brasileira (artigo 5º, VI) afirma que a liberdade de consciência e escolha de religião é inviolável e a proteção de locais de cultos e suas liturgias é garantida por lei”, justifica.

Por fim, o comunicado diz que a “Setec busca atuar com igualdade e atenção devidas, perante todas as religiões, e neste sentido, possui um relacionamento muito positivo com frequentadores e mantenedores do santuário”.

 

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