A Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) informou que adotou medidas preventivas e reforçou a conscientização de alunos contra a disseminação de boatos e discursos radicais.Segundo a coordenadora da SVC (Secretaria de Vivência do Campus), Susana Durão, o patrulhamento de segurança foi reforçado em todos os campi da universidade (Campinas, Limeira e Piracicaba) e, em especial no Cotuca (Colégio Técnico de Campinas), localizado no Centro de Campinas.
Apesar da ação, a coordenadora afirmou que não há registro de ameaças dirigidas à universidade – que, além de oferecer ensino superior, mantém o Cotuca, o Cotil (Colégio Técnico de Limeira) e unidades de educação infantil para filhos de servidores.
As medidas acontecem após a onda de ameaças e tentativas de ataque em diversas unidades de ensino em todo o país.
Sobre isso, a pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados, Telma Vinha, considerada uma das mais importantes pesquisadoras de problemas de convivência na escola e radicalização da juventude, afirma que a maior parte das mensagens veiculadas pelas redes sociais que tratam de supostos ataques em escolas tem características de um movimento organizado para causar pânico (veja mais abaixo).
O QUE FOI FEITO?
Segundo Durão, além do patrulhamento de segurança reforçado nos campis, foram feitos contatos, ainda, com a Guarda Municipal e a Polícia Militar, pedindo para que intensifiquem as rondas nas imediações dos campis. Contatos também foram feitos com o Conseg (Conselho de Segurança de Barão de Geraldo).
A coordenadora recomendou também que as pessoas baixem o aplicativo Botão do Pânico – que fornece à comunidade da Unicamp a possibilidade de registrar ocorrências dentro da área de cobertura do campus principal da Unicamp, da Moradia Estudantil e do Lume Teatro, todos localizados em Barão Geraldo, e do CPQBA (Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas), em Paulínia.
Quando acionado em emergências, o aplicativo envia à Central de Segurança da Unicamp as coordenadas GPS (latitude e longitude) registradas pelo celular.
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COLÉGIOS
Sobre a segurança nos colégios, a professora Cristiane Megid, titular da DEEPU (Diretora Executiva de Ensino Pré-Universitário), órgão responsável pelos colégios técnicos e pela Divisão de Educação Infantil e Complementar, afirmou que há um “estado de atenção”.
“Não estamos lidando com uma ameaça direcionada à nossa instituição, mas não fechamos os nossos olhos. Estamos em absoluto estado de atenção”, afirmou.
A professora diz que tem convivido com boatos sobre ataques em escolas desde a última segunda-feira (10) e, desde então, vem trocando informações com os diretores dos colégios e a coordenação da Dedic.
“Estamos em alerta para todas as informações que eventualmente cheguem”, afirma a diretora. Segundo ela, está sendo feito o acolhimento de famílias e de alunos que eventualmente queiram relatar algum acontecimento ou alguma mensagem que tenham recebido ou encontrado.
A diretora diz que, além do reforço do patrulhamento nas escolas técnicas e no núcleo de ensino infantil, a universidade tem trabalhado na direção da prevenção.
“Promoveremos palestras da SVC, junto com a professora Telma Vinha. A primeira ocorrerá na próxima sexta-feira, a partir das 10h, no Cotuca. A ideia é trabalhar na formação dos nossos alunos, contra a radicalização. Trabalhar em programas como a Câmara de Mediação. Além disso, vamos implementar com a professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas Andreia Freitas, a ampliação do programa de formação política de jovens, que já vem sendo aplicado no Cotuca. A ideia é levá-lo também para o Cotil e para a Dedic”.
“Vínhamos trabalhando nesse programa muito antes do ataque em Blumenau, mas a iniciativa se mostra muito mais necessária agora, para combater a radicalização entre os alunos”, completou.
INTENÇÃO DE PROVOCAR PÂNICO
Para a pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados, Telma Vinha, considerada uma das mais importantes pesquisadoras de problemas de convivência na escola e radicalização da juventude, a maior parte das mensagens veiculadas pelas redes sociais que tratam de supostos ataques em escolas tem características de um movimento organizado para causar pânico.
Esses eventos, segundo o que vem sendo difundido, ocorreriam especialmente entre 12 e 20 de abril, este último, dia do massacre de Columbine e aniversário de Hitler.
A professora estuda violência extrema em escolas desde o episódio em Suzano, em 2019, quando sete pessoas foram mortas. Segundo ela, muitas das mensagens com ameaças de ataques em escolas que ganharam as redes sociais nas últimas semanas, e têm preocupado autoridades, dirigentes de instituições de ensino, pais e estudantes, apresentam um padrão diferente do verificado entre adolescentes que interagem com comunidades extremistas.
De acordo com a pesquisadora, as expressões empregadas nas ameaças e as motivações das publicações diferem das utilizadas pelos jovens que cometem atentados.
“Tudo indica que se trata de uma ação coordenada intencionalmente para gerar o caos, mas não temos certeza ainda, porque está sendo investigado”, afirma a professora. “Nas mensagens analisadas foram encontradas muitas fake news e nem sempre se consegue separar o falso do verdadeiro”, completou.
Isso não quer dizer, segundo ela, que o perigo não exista.
“Em nenhum momento podemos afirmar que um ataque não vá acontecer. Não existe garantia, nem mesmo em instituições que são verdadeiros bunkers – tanto que nos Estados Unidos, país com a maior indústria de segurança escolar e o mais alto índice de armas em circulação, é o lugar onde com o maior número de tiroteios em escolas. Contudo, é preciso cautela e não entrar em pânico”.
EFEITO CONTÁGIO
De acordo com a especialista, também chamam a atenção as tentativas e ataques efetivamente realizados por estudantes após o que aconteceu nas escolas de São Paulo e de Blumenau.
“As investidas apresentam uma dinâmica diferente daquela identificada em ataques nos últimos dez anos, cujas características eram vivências negativas em escolas, interação desses jovens com fóruns online, racismo e misoginia. Tudo indica que esses novos ataques são decorrentes do chamado de ‘efeito contágio’, somado a outros fatores, entre os quais ressentimentos, raiva, preconceitos, impulsividade e transtornos mentais. Em linhas gerais, o ‘efeito contágio’ acaba inspirando novos ataques”, diz a professora.
E O QUE FAZER?
Na avaliação da especialista, a prevenção e o enfrentamento desse novo contexto passam pela articulação dos vários segmentos da sociedade. Ela é autora de inúmeros estudos que apontam a ineficácia de medidas de segurança como monitoramento e a presença de policiais, a despeito da falsa sensação de segurança que essas ações possam transmitir no curto prazo.
A docente sugere, diante desse quadro, que os dirigentes das instituições educativas discutam todas as dimensões do fenômeno, planejando uma atuação mais coesa e direcionada.
“Em seguida, é preciso que os gestores reúnam professores e funcionários de modo que, juntos, planejem ações de acolhimento e condutas comuns para evitar a disseminação de informações incorretas ou mesmo falsas”.
A especialista avalia que o mais adequado seria a escola fazer um comunicado institucional à família, por escrito, em vídeo ou em áudio, que aborde também as medidas governamentais para lidar com a situação. “Não para prometer, mas para dizer: ‘Estamos cientes, estamos cuidando disso e adotando medidas de prevenção’”, sugere.
Vinha reitera a importância da escuta, do diálogo e da conexão entre professores e adolescentes.
“Nesse contexto, é fundamental saber o que está acontecendo e como os jovens se sentem.”
A professora faz também algumas recomendações aos estudantes. A primeira, diz, é que eles devem evitar fazer ameaças de brincadeira, “ainda mais num momento de crise como este que estamos vivendo”.
Na opinião da especialista, o aluno precisa saber que não deve compartilhar informações desse tipo. Para além dessa orientação, deve denunciar esse tipo de material para os órgãos oficiais. A escola precisa, ainda, orientar sobre o que é necessário ser denunciado.
Por fim, na avaliação da docente, a instituição deve deixar claro para o estudante que a autodefesa não é o caminho. “Muitos estão levando faca para a escola, num suposto movimento de defesa. Ou seja, não podemos aceitar arma na escola, porque isso seria [usar a] violência contra a violência.”