Por Gustavo Queiroz, Mariana Hallal e Levy Teles
O histórico de votação dos parlamentares de partidos que negociam a formação de federações na eleição deste ano indica potenciais dificuldades para a consolidação das “fusões temporárias” entre as legendas. Levantamento do Estadão sobre as principais votações desta legislatura mostra que, apesar de convergirem na orientação a seus quadros nos últimos três anos, a afinidade entre as bancadas de PT e PSB, PSDB e Cidadania e PSDB e MDB diminui em temas de ordem fiscal, monetária e previdenciária.
Em discussão avançada sobre uma federação com o PSB, o PT terá outros desafios além das disputas regionais para celebrar a união. Em pautas governistas como pacote anticrime, autonomia do Banco Central, reforma da Previdência e PEC dos Precatórios, os petistas atuaram em bloco em quase todas elas. Já o partido comandado por Carlos Siqueira teve mais dificuldade de convencer seus membros a votar de forma conjunta.
O PSDB, que busca um acordo com MDB e Cidadania, votou afinado com seus possíveis parceiros na maioria dos casos. O tema que mais separou os tucanos dos demais partidos foi a PEC dos Precatórios. Enquanto deputados do PSDB formaram maioria para apoiar a proposta do governo, mais da metade das bancadas das outras duas siglas a rechaçaram.
REGRAS
Criado pelo Congresso no ano passado e regulamentado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o modelo da federação oferece às siglas pequenas a chance de escapar da cláusula de barreira, dispositivo que restringe a atuação de um partido que não alcançar determinado porcentual de votos. Entre os exemplos estão PV e PCdoB, que querem se unir ao PT e ao PSB. A cláusula de desempenho tem por objetivo diminuir a fragmentação partidária e aumentar as condições de governabilidade do Executivo.
Para especialistas ouvidos pelo Estadão, o comportamento dos parlamentares no Congresso é relevante na definição de parcerias. Diferentemente das coligações, as legendas federadas são obrigadas a atuar como um só partido nos próximos quatro anos, mantendo a postura programática. Os líderes não podem concorrer entre si nas disputas majoritárias e precisam driblar resistências internas às orientações partidárias. Parlamentares que divergirem das orientações do colegiado podem sofrer sanções, inclusive expulsão.
Na prática, se divergências persistirem e os partidos insistirem em atuar de forma hegemônica, a federação pode se tornar inviável na próxima legislatura, observou o cientista político José Álvaro Moisés. Segundo ele, o que está em jogo é a disputa de poder interno da união, que terá influência nas votações, na distribuição dos recursos e na escolha dos candidatos. Para Moisés, sem experiências pregressas para conhecer o comportamento dos partidos em uma federação, a forma com que as decisões serão tomadas precisará se basear em um estatuto bem definido, com programa claro e uma postura democrática.
VOTAÇÕES
Um dos primeiros temas pautados pela gestão Bolsonaro, a reforma da Previdência se tornou um desafio para o PSB, que, apesar de fechar questão e obrigar posicionamento contrário de sua bancada, viu 33% dos parlamentares votarem com o governo – no PT, todos disseram “não” à proposta. A desobediência levou o PSB a aplicar punição severa a dez deputados: nove tiveram as atividades suspensas e um foi expulso.
No caminho contrário, em 2019, uma versão “desidratada” do pacote anticrime proposto pelo então ministro e hoje presidenciável do Podemos, Sérgio Moro, teve 408 votos favoráveis e apenas 9 contrários. Dos poucos dissidentes, três eram petistas. Já o PSB foi unânime em votar “sim”.
Quando o governo Bolsonaro resgatou, em 2021, um projeto de lei que daria autonomia ao Banco Central, o Cidadania votou em bloco pela aprovação, enquanto PSDB e MDB não conseguiram garantir fidelidade de todos os seus deputados. Em proporção parecida, uma minoria de ambos os partidos preferiu recusar a proposta. Entre os tucanos, Aécio Neves (MG) foi contra.
Na ocasião, o PSB voltou a rachar. Cerca de 37,9% de sua bancada votou pela aprovação do projeto e 3,4% se abstiveram. No PT, todos os deputados rejeitaram a proposta.
Já na discussão sobre a PEC dos Precatórios, as orientações partidárias congestionaram as negociações. Enquanto a oposição foi fiadora do governo, com votos valiosos do PSB para a aprovação no primeiro turno, MDB e Cidadania foram mais contrários que favoráveis à alteração na política fiscal. O PSDB diferiu dos possíveis aliados e votou majoritariamente a favor.
(As informações são do jornal O Estado de S. Paulo)