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CotidianoCapes encerra repasses de verbas a institutos de pesquisa e surpreende cientistas

Capes encerra repasses de verbas a institutos de pesquisa e surpreende cientistas

Institutos desenvolvem grandes projetos em áreas de impacto social; há órgãos voltados para pesquisas que vão desde o desenvolvimento de vacinas até mudanças climáticas

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Laboratórios de ponta terão corte de repasse. (Foto: Divulgação)
Laboratórios de ponta terão corte de repasse. (Foto: Divulgação)

A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) vai encerrar os repasses a centros de pesquisa de ponta – os chamados Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs) – neste ano. A fundação argumenta que não tem mais recursos para novas bolsas de pesquisa ou para prorrogar a vigência dos auxílios aos INCTs em 2022. O comunicado pegou os coordenadores dos institutos de surpresa.

Esses institutos de pesquisa estão espalhados pelo País – são 101, no total. Eles desenvolvem grandes projetos em áreas de impacto social. Há institutos voltados para pesquisas que vão desde o desenvolvimento de vacinas até mudanças climáticas. Os grupos são chefiados por cientistas de renome. Ao longo dos trabalhos, recebem alunos de mestrado e doutorado e contam com a cooperação de cientistas do exterior para alavancar as pesquisas brasileiras.

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Em um ofício enviado aos coordenadores dos INCTs na semana passada, a Capes diz que “atingiu o financiamento total proposto para o apoio” aos projetos desenvolvidos nos INCTs. “Não dispomos de orçamento para acatar novas indicações ou conceder prorrogações de vigência, a partir de janeiro de 2022”, completou a Capes no documento.

A previsão era de repassar R$ 100 milhões aos INCTs com pagamento de bolsas nas modalidades de mestrado, doutorado, pós-doutorado e professor visitante. Segundo a fundação, os pagamentos começaram em janeiro de 2017 e deveriam durar cinco anos. A cada ano, poderiam ser pagos R$ 20 milhões, e os recursos não utilizados em um ano não poderiam integrar o orçamento do ano seguinte, conforme a Capes.

Já os coordenadores dos INCTs argumentam que os repasses de verbas pela Capes teriam de continuar, pelo menos, até o fim de 2022 porque a maior parte dos pagamentos só começou a ser feita no fim de 2017, quando os projetos se estruturaram para receber os recursos. Com a pandemia, também houve dificuldades de implementar bolsas para professores visitantes, já que as viagens estavam suspensas. Eles dizem ter sido pegos de surpresa com o anúncio do encerramento.

Em uma carta à presidente da Capes, Claudia Queda de Toledo, 84 coordenadores dos INCTs argumentam que pelo menos um quinto de R$ 100 milhões prometidos pela fundação vai deixar de ser pago com o fim dos repasses da Capes aos institutos no ano que vem. “Esta decisão atinge profundamente um dos programas mais exitosos do País no apoio à Ciência, Tecnologia e Inovação”, escrevem os cientistas.

Por meio de nota, a Capes não informou quanto efetivamente pagou aos INCTs ao longo dos cinco anos, mas disse que “todas as bolsas cujas implementações foram solicitadas à Capes pelos coordenadores foram efetivamente implementadas”. Também informou que os coordenadores já sabiam, desde 2017, que a vigência dos projetos chegaria ao fim agora. Foram implementadas 1.651 bolsas ao longo dos cinco anos nos INCTs.

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Problemas orçamentários levaram, neste ano, ao atraso no pagamento de outra modalidade de bolsas da Capes, voltadas para estudantes de Licenciaturas. Alunos de graduação que recebiam R$ 400 tiveram seus pagamentos suspensos por falta de verba. Foi preciso aprovar um projeto de lei no Congresso para liberar os recursos, mas a demora levou parte dos jovens a abandonar os projetos e buscar emprego.

Os INCTs também recebem recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e das fundações estaduais de amparo à pesquisa. Mas os cientistas dizem que já contavam com os aportes da Capes no ano que vem – e, agora, terão de replanejar as ações. O papel da Capes nesses centros de pesquisa é apoiar a formação dos cientistas. Já os recursos para a compra de equipamentos e reagentes vêm do CNPq.

O pesquisador Adalberto Val, coordenador do INCT Adapta, um centro de estudos de adaptações aquáticas da Amazônia, afirmou que se preparava para receber pesquisadores estrangeiros no início de 2022 – ação que não foi possível antes por causa da pandemia. O objetivo era trazer cientistas experientes na área e promover o contato das pesquisas nacionais com os estudos estrangeiros. A permanência deles no Brasil deveria ser custeada pela Capes.

“Como vou falar para meus colegas estrangeiros que a bolsa deles não vai sair?”, indaga Val, professor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. Além dessas bolsas, o INCT Adapta também contava com recursos da Capes para levar ao Amazonas, em março, uma pesquisadora cearense referência em comportamento de espécies – o que também não deve mais ocorrer.

“Minha vontade é dizer que não dá mais, que vamos fechar isso aqui. Cada dia é uma luta nova, uma coisa diferente”, completa o pesquisador, que vê cientistas brasileiros deixarem o País por falta de incentivo. Entre outros temas, o instituto realiza pesquisas sobre adaptações biológicas às mudanças ambientais.

No INCT de Fluidos Complexos, o coordenador Antonio Martins Figueiredo Neto teme pela continuidade de pesquisas ligadas à covid-19. Um dos estudos do centro, que reúne pesquisadores de várias áreas, tenta identificar características que podem levar infectados a desenvolver sequelas. “Não há de onde tirar recursos”, diz Neto, doutor em Física e professor da Universidade de São Paulo (USP).

“Os INCTs todos tinham bolsas acopladas aos projetos. Agora, como fazer projetos sem alunos?”, indaga a geneticista Mayana Zatz, coordenadora do INCT de Envelhecimento e Doenças Genéticas, com sede na USP. Ela lembra que o instituto de pesquisa costuma receber muitos estudantes de mestrado e doutorado que não são de São Paulo. “Eles precisam da bolsa para sobreviver. As pessoas têm impressão que a bolsa é complementação de salário, mas é o único sustento que eles têm ”

Segundo Jailson Bittencourt de Andrade, coordenador do INCT de Energia e Ambiente, com sede em Salvador, houve indicação por parte do CNPq de que haverá recursos para os INCTs em 2022 – o que não ocorreu em relação à Capes. “É uma situação em que se planeja fazer 100% e sabe que vai fazer 50% ou a depender do que planejou, precisa replanejar”, diz. “Não teremos pesquisadores novos começando.”

A Capes informa que limitações legais impedem que um valor não gasto em um ano seja usado no ano seguinte. Também afirma que continuará a pagar as bolsas ativas até o fim de suas respectivas vigências – são 260. “Isto representa um investimento adicional de R$ 3.808.910,84 a serem investidos pela Capes em 2022 e 2023”, informou a fundação. “Trata-se de um grande projeto e que será certamente estudado para uma nova edição e publicação em parceria”, concluiu.

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Bruno Moraes
Bruno Moraeshttps://www.acidadeon.com/saocarlos/
Bruno Moraes é repórter do acidade on desde 2020, onde faz a cobertura política e econômica. É autor do livro “Jornalismo em Tempos de Ditadura”, pela Paco Editorial.
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