No centro de uma ameaça de crise nos moldes da que ocorreu em 2008, a Evergrande tem suscitado dúvidas sobre a sua importância no mercado chinês e impacto que poderia causar numa economia global que sofre para remediar os prejuízos da pandemia de Covid-19.
O risco de “default”, termo em inglês que designa falha no pagamento de compromisso financeiro, levou bolsas de valores do mundo todo a resultados negativos à medida em que o dia raiava em diferentes lugares do globo.
O Oriente para o Ocidente, Hong Kong teve um tombo ontem (20) de 3,3%, com as ações da Evergrande negociadas no mercado local com descontos de mais de 10%.
O feriado em parte da Ásia aliviou na China, Japão, Coreia do Sul e Taiwan, mas não perdoou em Londres (-0,86%), Frankfurt (-2,31%), Paris (1,74%), Milão (-2,57%), Madri (-1,20%) e Lisboa (-1,62%). Em São Paulo, envolto em preocupações locais, a Ibovespa principal índice acionário nacional fechou na menor pontuação do ano, com queda de 2,33%.
Mas, afinal, o que é a Evergrande, essa empresa capaz de causar tremores e temores em mercados do mundo todo?
Um dos principais players do mercado imobiliário chinês, a Evergrande Real Estate é responsável por mais de 1.300 projetos imobiliários em 280 cidades. Mais de 12 milhões de chineses foram atendidos pela empresa.
Os números grandiosos se traduzem no valor de mercado da empresa, que faz parte de um conglomerado ainda maior. A Evergrande Group vale R$ 1,9 trilhão (US$ 360 bi). Para efeito de comparação, no último trimestre de 2020, todas as riquezas produzidas no Brasil somaram R$ 2 trilhões.
O grupo faz absolutamente de tudo. Atua no mercado de automóveis, saúde, tecnologia e até em time de futebol. Foi fundado em 1996 com o nome de grupo Hengda por Xu Jiajin, a empresa teve crescimento vertiginoso e teve oferta pública de ações em 2009.
No mercado automotivo, a Evergrande tem investido na mobilidade elétrica. No ano passado, apresentou ao mercado uma série de modelos elétricos para produção em massa. O apetite da empresa é tanto que adquiriu a fabricante sueca NEVS, especializada no ramo.
Na saúde, tem aliado a capacidade de construção à necessidade crescente chinesa de cuidados pessoais de idosos. Empurrada pela transformação da pirâmide etária, na qual o número de idosos é crescente, a companhia investiu em ativos como hospitais e comunidades para idosos que pouco lembram os asilos brasileiros.
O grupo ainda mantém ativos como a empresa de mídia Karen Teng Network Limited, em parceria com a também chinesa Tecent, e a Ruyi Pictures. No ramo financeiro há negócios como a companhia de seguros Evergrande Life e no de alimentação está empreendendo com a Hengda Bingquan, sua marca de água mineral.
Há, ainda investimentos no esporte, com o time Guangzhou F.C., cuja propriedade é dividida com o grupo Alibaba outro gigante chinês. Na música, há a Xinao Music.
O tamanho da empresa e a sua importância no gigantesco mercado chinês é a principal causa dos temores dos economistas sobre a possibilidade de uma eventual quebra da Evergrande causar abalo semelhante ao do subprime em 2008.
O passivo da empresa é de US$ 300 bilhões. Segundo o portal Nikkei Asia, mais de 120 bancos e 120 instituições não bancárias estão entre os credores da empresa, que já avisou não ter caixa para pagar as dívidas imediatas. O risco de default entre as empresas imobiliárias chineses tem feito com que bancos e corretores de primeira linha não aceitem mais empréstimos nem com garantias de incorporadores altamente endividados, afirma o site asiático.
Analistas do Oriente especulam sobre a capacidade de o grupo sair da crise, mesmo com a venda de outros ativos. Um socorro estatal chinês entrou no radar de quem acompanha de perto os movimentos da Evergrande.
Mas, e o Brasil?
Além da queda na B3 antiga Bovespa os movimentos da Evergrande podem causar outros impactos na economia brasileira. Aliás, já vem causando mudanças.
É que a China é uma das principais clientes brasileiras e responsável por parte considerável das trocas comerciais internacionais. Um dos principais produtos negociados com os chineses está o minério de ferro e o aço matéria-prima fundamental para a construção civil.
A ameaça de quebra da segunda maior incorporadora chinesa derrubou as cotações do ferro na segunda-feira. No porto de Qingdao, na China, o insumo foi negociado com descontos de 8,8% ontem. De quebra, empresas brasileiras como a CSN, Gerdau e Usiminas, produtoras nacionais de aço, também fecharam em baixa.
De risco real à economia, economistas avaliam não haver grandes riscos ao sistema bancário, mas a atual crise da gigante asiática pode influenciar nos próximos passos na política habitacional chinesa, o que, sim, tem impacto no mercado nacional.