A quadrilha que roubou US$ 5 milhões em um crime cinematográfico cometido em março de 2018 no Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas, abriu e constituiu uma empresa de transporte na região com a intenção de lavar o dinheiro levado no crime. O montante fazia parte da carga de um avião da Lufthansa que se dirigia para Zurique, na Suíça (veja detalhes do caso abaixo).
“Nós temos a movimentação financeira dela de 2019 a 2021. Foi uma empresa que teve atividades lícitas, mas que não justificam esse volume de movimentação. Os valores de crédito e débito eram idênticos até nos centavos. Ou seja, é típico de uma entrada pra justificar a lavagem de dinheiro”, diz o delegado chefe da PF (Polícia Federal) de Campinas, Edson Geraldo de Souza.
Os investigadores também mapearam o uso do dinheiro para a compra de oito imóveis na região de Campinas e um em Furnas, em Minas Gerais. De acordo com a apuração, diversos veículos também foram adquiridos. Os valores de cada aquisição giravam entre R$ 250 mil e R$ 300 mil. “Houve inteligência na distribuição. Não compravam nada de luxo e grandioso”, complementa Souza.
Segundo a corporação, a operação denominada “Occulta Pecunia II” cumpriu mandados para aprofundar as investigações sobre crimes de lavagem de dinheiro que vieram do assalto milionário. O trabalho foi iniciado logo após o crime e já teve diversas ações e operações (relembre abaixo). Três mandados foram cumpridos hoje em Campinas, no bairro São Domingos, e em Indaiatuba, no Jardim Esplanada e Jardim São Paulo.
NINGUÉM FOI PRESO
O cumprimento dos três mandados de busca e apreensão nesta terça-feira (6) mirou principalmente documentos ligados à quadrilha e que comprovariam as irregularidades. A ideia é que os suspeitos identificados comprovem a licitude dos bens. “Não há a necessidade de prisão, porque o que nós visamos, neste momento, é a identificação e o rastreamento dos bens”, explica o delegado.
“É um dos raros casos na lei processual penal em que há a inversão do ônus da prova, que é o que temos nesse caso. Ou seja, nós identificamos os imóveis, os veículos e a empresa – todos ligados indiretamente a um dos principais executores do roubo. O próprio constituinte da transportadora tinha uma renda de R$ 2 mil, mas integralizou o capital social em R$ 110 mil”, pontua ele.
Se não conseguiram provar que os bens foram adquiridos legalmente, os envolvidos devem responder pelos crimes de lavagem de dinheiro e associação criminosa, cujas penas somadas podem chegar a mais de 14 de anos de prisão.
COMPRA DE IMÓVEIS
Segundo a PF, na primeira fase da operação, foi descoberta uma associação de pessoas “que de maneira estruturada e ordenada, dissimularam a origem do patrimônio, com a utilização de diversos subterfúgios para a execução, como compra e venda de imóveis, aquisição de veículos e a criação de uma empresa de transportes em Paulínia, interior de SP, para circulação de recursos”.
Nesta fase, policiais buscam provas sobre a ocultação do dinheiro do roubo por meio da compra de um imóvel residencial em Campinas e de repasse de grandes quantias a dois sócios ocultos da empresa, que após o roubo, entre julho de 2019 e novembro de 2021, movimentou aproximadamente R$ 10 milhões.
LEIA TAMBÉM
Sequestro termina com perseguição, acidente e bandido morto em Campinas
Campinas registra alta nos atendimentos de casos respiratórios; vacinação contra a gripe continua
CRONOLOGIA DOS FATOS
O ROUBO
O crime aconteceu no na noite de domingo, 4 de março, quando homens armados entraram no terminal após destruição de um alambrado, de correntes e cadeados utilizados no fechamento de portões de acesso à área do terminal de cargas.
Os criminosos abordaram e mantiveram em cárcere privado dois seguranças, além de funcionários das empresas Swissport, Orbital e Brinks, até conseguirem transferir 13 sacolas contendo numerário em espécie no valor de US$ 5.058.390,41, que estavam armazenados em um container recém descarregado do avião da Lufthansa. O malote foi transferido para veículo clonado da empresa Aeroportos Brasil, que administra o terminal.
O dólar estava cotado a R$ 3,25 em março, levando a conversão a R$ 16.439.768,83 naquela data. Os criminosos deixaram o local e não foram encontrados.
APREENSÃO EM 2018
Dezoito dias após o roubo, a Polícia Civil apreendeu US$ 20 mil, com uma mulher em São Paulo. O dinheiro foi periciado e constatado, por meio do número de série, que fazia parte dos 13 malotes que estavam no contêiner que seria enviado para Zurique, na Suíça.
OPERAÇÃO TANGO VICTOR EM 2020
A partir dessa apreensão em São Paulo, a Polícia Federal iniciou uma nova investigação, resultando na Operação Tango Victor, que cumpriu três mandados de prisão temporária um de busca e apreensão em desfavor de três integrantes da associação criminosa responsável pelo roubo. Um homem e uma mulher foram presos.
“O homem, o principal investigado e apontado como mentor do roubo, foi preso na BR-364 (Porto Velho), pela Polícia Rodoviária Federal, enquanto a mulher foi presa pela Polícia Federal na capital paulista. O terceiro investigado, companheiro da mulher, e suspeito de ter participado da execução do roubo, não foi localizado; posteriormente, porém, apresentou-se à Justiça Federal”, informou a PF.
MORTE DOS INVESTIGADOS
Solto e respondendo à investigação em liberdade, o principal investigado pelo roubo foi assassinado em via pública, em maio de 2021, no Jardim Melina, em Campinas, por dois homens usando capacetes fechados.
A investigação do homicídio foi conduzida pela Polícia Civil. Após o relatório, o Ministério Público de São Paulo promoveu, em março o arquivamento do inquérito policial que investigou a referida morte em razão da ausência de elementos que elucidassem a autoria.
O segundo investigado, também procurado na Operação Tango Victor, que não havia sido preso, mas se apresentou à Justiça, foi assassinado em outubro de 2022, quatro meses após ser ouvido na Polícia Federal.
OCCULTA PECUNIA I
No mesmo mês de outubro de 2022, mesmo com a morte dos dois principais investigados, a Polícia Federal já havia aberto uma nova linha de trabalho para apurar atos de ocultação do dinheiro roubado.
“Com a instauração do inquérito policial e o avanço das investigações descobriu-se a associação de várias pessoas, de maneira estruturada e ordenada, que dissimularam a origem do patrimônio, com a utilização de diversos subterfúgios para a execução do crime, como compra e venda de imóveis, aquisição de veículos e criação de empresa para circulação de recursos”, explicou a corporação em nota.
A investigação resultou na Operação Occulta Pecunia, deflagrada em novembro de 2022, que deu cumprimento a cinco mandados de busca e apreensão, para obter novas provas do crime, e contou com a atuação conjunta do Ministério Público Federal e BAEP Campinas.
Houve buscas nos estados de São Paulo (3 em Campinas, 1 em Sumaré, ambas em SP) e Alagoas (1 em Belém, PA).
“Os elementos colhidos continuam em análise, mas permitiram identificar mais 3 pessoas que hoje são investigadas na Operação Occulta Pecunia II”, finalizou a PF.
LEIA MAIS
Tarifa Zero: São Paulo estuda aplicar passe livre nos transportes públicos