Uma das maiores dores emocionais que um ser humano está exposto é a morte de um filho, já que inverte a ordem natural das coisas. Felipe, nome fictício, quase passou por isso. A filha dele, de 14 anos, tentou suicídio duas vezes.
Segundo o pai, antes da pandemia, a menina já voltava muito triste da escola por ser vítima de bullying, sentindo-se isolada e sozinha. Os pais acharam que seria reflexo da adolescência. Durante o pico da pandemia do Coronavírus, no período de isolamento, com os contatos apenas virtuais, ela parecia menos angustiada e triste. Com o retorno das aulas presenciais, os problemas voltaram.
Vale destacar que o mês de setembro é o mês de conscientização sobre o suicídio. Segundo levantamento da secretaria de Saúde, Campinas registrou 67 ocorrências de suicídio ano passado. O número é maior do que o registrado em 2020, que teve 59 casos, e menor do que em 2019, quando foram 88 registros. Saiba mais aqui!
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CULPA
Foram duas tentativas de suicídios, sucedidas de um sentimento de culpa dos pais. Eles precisaram procurar orientação médica para entender que esse tipo de comportamento entre adolescentes não é tão incomum. Para Felipe, é de extrema importância a relação de cumplicidade entre pais e filhos.
“Nós pais temos que ter a sensibilidade em perceber mudanças emocionais em nossos filhos, ter um diálogo aberto entre a família e a escola. Buscar informações e contar com ajuda de profissionais habilitados”, conclui.
Para Tatiana Slonczewski, professora de Psicologia da PUC-Campinas e responsável pelo Projeto Girassóis – Conscientização sobre prevenção do suicídio em contextos de educação e assistência social -, quem já passou por uma situação como essa enfrenta muitos questionamentos.
“O suicídio ainda é assunto que envolvem tabus e estigmas. Uma tentativa de suicídio é algo muito dramático tanto para quem sobreviveu quanto para seus familiares, que vão se sentir culpados e marginalizados, imaginando que poderiam ou deveriam ter feito algo para evitar o problema, mas prevenir o suicídio é realizar um conjunto de ações que não depende apenas das famílias e indivíduos. É ilusório considerar que o suicídio possa ser previsto e evitado na totalidade dos casos”, analisa a professora.
Ela ressalta que nem sempre é possível ter clareza na identificação dos comportamentos suicidas, pois muitas vezes eles ocorrem de forma silenciosa e demandam muita capacidade de observação e escuta atenta para acessar o que a pessoa realmente está sentindo.
Ela reforça que as famílias de pessoas em risco para suicídio precisam de acompanhamento profissional especializado e de suporte emocional, sejam estes individuais ou em grupo.
SINAIS
Tatiana explica que o comportamento suicida inclui desde ideias frequentes de que seria melhor morrer, passando pelo planejamento, tentativas e o próprio ato de dar fim à vida. Esse é um comportamento que pode se apresentar em pessoas de diferentes faixas-etárias e níveis socioeconômicos, sendo que, no Brasil, suas taxas encontram-se em elevação.
Os cuidados variam de acordo com o grau de risco e intencionalidade da pessoa quanto ao suicídio. A partir da avaliação dos riscos é que deve ser decidido como a situação será enfrentada, desde apoio nas relações mais próximas, passando por um acompanhamento profissional, até os casos que demandam internações.
Segundo a professora universitária, há sinais de que a pessoa precisa de cuidados, tais como a comunicação verbal direta ou indireta quanto ao desejo de morrer ou de cessar o sofrimento, e a mudança de comportamentos.
“É preciso observar se há mudanças súbitas na forma como a pessoa se comporta, se houve tentativas de suicídio anteriores, se há um transtorno mental e/ou uso prejudicial de substâncias como álcool e drogas, isolamento social, afastamento das relações sociais, condutas mais explosivas, tolerância mais baixa à frustração, mau desempenho na escola, até mesmo providências como se desfazer de bens, de contas em banco ou comprar algo que possa ser usado no suicídio. A pesquisa frequente sobre o tema em redes sociais, escrever cartas de despedida e a recusa ao tratamento dos transtornos mentais também são sinais de alerta que precisam ser levados em conta”, afirma Tatiana.
No caso de crianças e adolescentes, a docente afirma que o papel dos professores é fundamental e que eles são figuras centrais na prevenção. Em 2000, a OMS (Organização Mundial de Saúde) publicou uma cartilha com orientações a educadores. No mundo todo, eles são treinados para ajudar estudantes que estão enfrentando o problema. Segundo Tatiana, o educador precisa aprender a ouvir e para onde conduzir um aluno que demonstra comportamento suicida.
“Professores precisam ser capacitados porque lidam com os jovens, conhecem as rotinas deles. Eles podem ser capacitados para identificar um adolescente em risco e apontar situações preocupantes. Um indivíduo sozinho não fará tudo o que é necessário para a prevenção, mas uma rede articulada de cuidados e serviços pode fazer. O professor precisa ter com quem compartilhar essas preocupações, incluindo os pais e responsáveis”, conclui a professora
Tatiana coordena o Projeto Girassóis, extensão universitária da Faculdade de Psicologia da PUC-Campinas que pretende sensibilizar e conscientizar pessoas da sociedade sobre a importância de compreender e prevenir o comportamento suicida.
O programa tem ações em escolas, centros de assistência social e demais espaços comunitários, considerando que estes contextos representam papel importante na sociedade.
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