A cada dois anos a história se repete. Você acorda cedo no domingo, vai naquela sua gaveta em que você guarda notinhas e papéis antigos que acumularam demais para você ter tempo de jogar fora, e procura fundo por um documento que por vezes passa despercebido no dia a dia, mas que de repente se torna muito importante. Você acha seu título de eleitor, limpa-o da poeira e pesquisa na internet a sua zona eleitoral, torcendo para que tudo se resolva no primeiro turno só para não ter de repetir todo o processo.
Dentro de um universo democrático, existem, em geral, dois tipos de eleitores: os que foram acima representados, que se perguntam o motivo de estarem sendo obrigados a votar; e os que o fazem de bom grado, esperançosos de que seu voto irá promover as mudanças que julgar necessárias. A dúvida que nos faz perguntar se o voto deveria ser obrigatório ou voluntário não é recente e já foi objeto de muito debate, não necessariamente apresentando uma resposta definitiva. Hoje iremos tentar conhecer um pouco mais dessa discussão.
O ato de votar faz parte de um dos direitos fundamentais em qualquer democracia e não é diferente no Brasil. Apesar disso, nem sempre funcionou da forma como é hoje. O voto foi considerado como obrigatório apenas em 1946, onde todos os maiores de 18 anos (com exceção dos analfabetos) poderiam exercer o direito ao voto, configurando a maior experiência democrática que o país havia experimentado até então. Ao pensarmos nas vantagens de se manter o voto obrigatório, da exata maneira em que ele está, temos as seguintes proposições: se todos aqueles entre 18 e 70 anos são obrigados a votar, independentemente da etnia, renda e alfabetização, isso significa que o universo de eleitores é maior, o que constrói uma também maior representatividade; além disso, contribui para criar nos cidadãos uma espécie de consciência política e democrática e reforçaria a importância do ato de votar.
No entanto, há quem defenda o voto facultativo, isto é, a não obrigatoriedade do voto, como a melhor maneira de se expressar politicamente. Para essas pessoas, o voto obrigatório não necessariamente se traduz em uma maior participação e representatividade, pois ainda que seja obrigatório, muitas pessoas não comparecem no dia da eleição (as chamadas abstenções), ou, quando comparecem, podem vir a não exercer seu direito de voto de maneira “séria”, ou seja, podendo acabar votando “em qualquer um”, não refletindo sobre seu voto. Outro argumento é o de que ao tornar o voto facultativo, os políticos seriam retirados de sua zona de conforto, pois antes de convencer o cidadão a votar nele, ele teria de convencê-lo a primeiramente votar. Isso seria uma maneira mais efetiva de construir uma consciência política do que simplesmente obrigar a todos a votar sem um incentivo à reflexão.
Nesta discussão há um contraponto interessante para aqueles que criticam a obrigatoriedade do voto: nenhum cidadão é obrigado a escolher um candidato, candidata ou partido. Tampouco tem a obrigação de realizar um voto válido. Todos e todas têm a opção de votar branco ou nulo. Também têm a opção de se ausentar e justificar posteriormente sua ausência. O que é obrigatória, no caso, é a justificativa para a justiça eleitoral, sujeita a sansões caso não seja realizada. Ou seja, o voto é um direito conquistado fundamental para a democracia, que acompanha uma obrigatoriedade de prestação de contas devido à sua importância.
Uma discussão que precisa acompanhar a temática do direito ao voto é o debate sobre o direito à educação política, pois é só quando entendemos a importância do voto e a legitimidade e importância das eleições, que compreendemos o assunto de maneira mais abrangente, visto que ainda temos uma democracia jovem, a qual foi (e continua sendo) constantemente ameaçada e marcada por golpes. O voto e a consciência política são talvez a forma mais potente que temos para continuarmos protegendo-a. Portanto, participe, leia, procure saber das necessidades de sua rua, as demandas de seu bairro e de sua cidade, procure os seus representantes ou, caso não haja, coloque-se nessa posição e ajude a construir, independentemente do voto ser obrigatório ou facultativo, uma verdadeira consciência política e democrática.
* Alunos de Graduação do Curso de Ciências Sociais da UNESP – Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara. O projeto “Pílulas de Educação Política” é realizado sob a supervisão do Prof. Danilo Forlini, responsável pela disciplina “Ciências Sociais e Educação: Diálogos com a Ciência Política” feito em parceria com o Prof. Bruno Silva, coordenador do blog Multipli_Cidade do Portal A CidadeON.