Há um grupo de pessoas que têm certo receio que a sexualidade seja um assunto abordado na escola. Esses grupos normalmente reproduzem o seguinte questionamento: Teriam direito, os professores e a escola, de impor aos alunos seus valores pessoais sobre o que consideram certo ou errado sobre a sexualidade? Certamente a resposta é não. Concordamos com este ponto. Agora, vamos pensar um pouco: fazendo parte da função da escola o compartilhamento dos conhecimentos produzidos historicamente e cientificamente pela sociedade, a reflexão crítica e o acesso à informações objetivas sobre o mundo em que vivemos e o que já sabemos sobre nossa saúde e nosso corpo, não é um dever da escola e um direito do aluno que esses conhecimentos sejam compartilhados?
É função da escola e dos professores criar oportunidades de reflexão e discussão para que os alunos tenham acesso a esses conhecimentos e possam, de posse de informações bem fundamentadas acerca de seu próprio corpo e biologia, formar suas próprias visões e opiniões, a partir daquilo que já pensam e que escutaram em casa, somados também às informações objetivas, clara e científicas que terão acesso na escola. Temas como gravidez, concepção, homossexualidade, aborto, infecções sexualmente transmissíveis, masturbação e relações sexuais em geral estarão presentes na vida e nas rodas de conversas dos adolescentes de qualquer maneira. Grande parte das famílias não tem abertura para conversar sobre esses temas em casa. Se retiramos o papel da escola nessa dimensão da educação, quem vai educar os estudantes sobre estes temas serão os próprios amigos, os sites de pornografia e os vídeos e notícias de fontes duvidosas que eles recebem nas redes sociais. Não parece um caminho muito inteligente.
O conservadorismo, ao longo dos anos, vem ganhando cada vez mais força no cenário escolar, principalmente através do medo gerado pelo tema da sexualidade, compreendido de forma equivocada por quem não entende do assunto. O termo “ideologia de gênero” começou a ser mais difundido nos setores conservadores da sociedade a partir da década de noventa, de forma negativa, fazendo com que os temas sobre sexualidade e gênero passem a ser uma preocupação de certos pais e responsáveis, que passaram a temer que seus filhos sejam influenciados pelos educadores e a instituição, que, em sua visão, colocariam, para seus filhos, valores muito diferentes do que defendem e que os tais temas abordados em sala de aula poderiam resultar em mudanças drásticas na vida dos jovens. Entendemos este receio esta preocupação não se justifica na prática. Vamos explicar o porquê.
Existem equívocos sobre o que é o estudo de sexualidade em sala de aula e muitas falácias à seu respeito. Para desmistificá-los, é necessário ter clareza sobre o significado de sexo e sexualidade. O primeiro está relacionado diretamente ao ato sexual e à satisfação de necessidades biológicas. Sexualidade, por sua vez, inclui o sexo, a afetividade, o carinho, o prazer, o amor ou o sentimento mútuo de bem querer, os gestos, a comunicação, o toque e a intimidade. Inclui, também, os valores e as normas morais que cada cultura elabora sobre o comportamento sexual. Portanto, ao contrário do que se acredita, a educação sexual não se trata de ensinar “conteúdos vulgares” ou “como se faz sexo” à crianças e adolescentes, mas sim ensiná-los a conhecer e respeitar seus corpos e identidades, ensiná-los a reconhecer situações de abuso (infelizmente tão frequentes em nossa sociedade) e provê-los com informações precisas acerca de como seus corpos funcionam, desmentindo mitos que normalmente confundem os adolescentes nessa etapa da vida.
A Educação Sexual pode ser definida como toda ação ensino-aprendizagem sobre a sexualidade humana, considerando o conhecimento de informações básicas, sobre consenso, discussões e reflexões de valores, sentimentos, normas e as atitudes ligadas à vida sexual que tenham a finalidade de preparar o educando para viver a sexualidade de forma positiva, saudável e feliz, e, sobretudo, para formá-lo como cidadão consciente, crítico e engajado nas transformações de todas as questões sociais ligadas, direta ou indiretamente, à sexualidade.
Nesse sentido, constata-se a importância de se falar sobre sexualidade no ambiente escolar e a necessidade de uma Educação Sexual que resgate a criança e o jovem de forma global, embasada no respeito e no conhecimento do ser humano como um todo, na qual prevaleça a qualidade e a afetividade nas relações sociais e sexuais e discutindo e refletindo sobre o respeito mútuo, os temas relacionados à sexualidade e os preconceitos e discriminações, sempre buscando uma linguagem humana. Para que o trabalho de Educação Sexual seja efetivo, ele deve abranger a família, os espaços educativos e o Estado através de projetos em nível governamental que envolvam essas esferas.
* Alunas de Graduação do Curso de Ciências Sociais da UNESP – Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara. O projeto “Pílulas de Educação Política” é realizado sob a supervisão do Prof. Danilo Forlini, responsável pela disciplina “Ciências Sociais e Educação: Diálogos com a Ciência Política” feito em parceria com o Prof. Bruno Silva, coordenador do blog Multipli_Cidade do Portal A CidadeON.