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BairrosCasa Grande e Tulha: Um conjunto tombado na região do Jardim Proença

Casa Grande e Tulha: Um conjunto tombado na região do Jardim Proença

No bairro Vila Lemos, há uma casa grande e uma tulha que remontam ao século XIX e XVIII e fazem parte da história de Campinas

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Quem anda pela Avenida Dr. Arlindo Joaquim de Lemos pode se deparar com um conjunto arquitetônico que destoa no bairro Vila Lemos, na região do Jardim Proença, em Campinas. De um lado, a fileira de prédios modernos que cobrem grande parte da avenida, do outro, um muro de cercas vivas e uma antiga construção em meio às árvores.

Uma entrada, protegida por dois portões – uma de vidro e outra de grades de ferro -, separam um pedaço de Campinas histórica do resto moderno da região. De acordo com o professor e arquiteto urbano Luiz Cláudio Bittencourt, esse pode ser um dos mais antigos edifícios de pouso que se tem registro.

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Não se sabe ao certo quando o conjunto foi construído. Algumas investigações apontam para o final do século XVIII. O professor Bittencourt explica que o edifício pode ser datado bem antes. Segundo pesquisas feitas pelo arquiteto e urbanista Antonio da Costa Santos, o lugar já foi usado como pouso de tropeiros.

De acordo o pesquisador Pedro Francisco Rossetto, no artigo “Reconstituição do traçado da ‘estrada dos Goiases’ no trecho da atual mancha urbana de Campinas”, a origem da cidade está relacionada com a rota conhecida como “caminho geral dos Goiases”. Essa estrada partia do que hoje é São Paulo, margeava a encosta da serra da Mantiqueira, atravessava os atuais municípios de Jundiaí, Mogi-Guaçu, Casa Branca e Franca e chegava à região das minas de Goiás. 

O pesquisador explica que os tropeiros repousavam em clareiras, ou “campinhos”, próximos das estradas. E, nesses núcleos, a atual cidade de Campinas nasceria. Acredita-se, portanto, que um desses pousos é a atual tulha da Vila Lemos.

Eventualmente, com o desenvolvimento do território, Rossetto explica que o trajeto da estrada mudou. Ele diz que o caminho deixou de passar pelo antigo pouso e atingiu o que hoje é a atual Barão de Jaguara.

Ao longo da história, a tulha também passou pelo período cafeeiro campinense, época que acredita-se que foi construída a casa grande. Segundo Bittencourt, o lugar tem uma característica única, por ter uma “geometria absurdamente regular”, o que a diferencia de outras construções semelhantes da época.

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No instituto de arquitetos do Brasil, no núcleo regional de Campinas, a utilização original é classificada como “engenho colonial e sede da fazenda cafeeira do período colonial”. Com base nas investigações de Antonio, o instituto explica que a tulha fez parte da primeira sesmaria da região e as terras pertenceram a Antônio Maria de Abreu e ao seu cunhado, João Bueno da Silva. Bittencourt diz que, possivelmente, no terreno, comerciava-se mão de obra escrava no período cafeeiro, por conta de um espaço atípico ao lado da casa. 

“A tulha teria sido erguida em taipa de pilão na década de 1790, quando de posse de Cláudio Fernandes de Sam Payo e sua mulher Rosa Maria de Abreu e Silva (pioneiros no município) e a “casa grande”, construída pela filha e herdeira Maria Felicíssima M. Abreu, por volta de 1830”, diz a pesquisa de Toninho, como era conhecido.

Na década de 1980, o arquiteto e urbanista Antonio da Costa Santos, adquiriu a propriedade. Nele, o pesquisador realizou um trabalho de restauração e usou o espaço como um “laboratório” para entender melhor a história de Campinas, de acordo com o advogado e colaborador William Ceschi Filho para a TV Câmara.

Por conta do rigoroso trabalho de restauração de Toninho, o espaço foi tombado em 1986 pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico) e, em 1990, pelo Condepaac (Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas). Com os estudos, Antonio obteve o título de doutor e as pesquisas foram publicadas na obra “Campinas: Das origens ao futuro”, lançada em 2002.

CASA GRANDE E TULHA NOS DIAS DE HOJE

Leo é jardineiro e trabalha há 37 anos na Casa Grande e na Tulha (Foto: Tudo EP)

Atualmente, quem cuida do espaço histórico é Leonildo Antonino. Ele trabalha na propriedade de Antonio há 37 anos e tem orgulho de estar ali. “Trabalho com jardinagem e serviços gerais. Conheci muito o Toninho. E esse bairro aqui, eu acho muito maravilhoso”, afirma. “Eu vim de Pernambuco e já morei em vários lugares de Campinas, mas foi aqui que mais fiquei”.

Segundo Leo, como é conhecido pelos colegas do bairro, a sua função principal na Casa Grande e Tulha é jardinagem, mas também faz manutenção sempre que necessário no espaço.

“Ele [Toninho] está sentindo que eu estou aqui trabalhando, fazendo as coisas certas e cuidando do jardim do jeito que ele gostava”, 

afirma.

Sobre a limpeza, ele alerta. “Você já imaginou se isso tudo aqui estivesse abandonado?”. Não tem como saber o que seria do espaço se não houvesse alguém para cuidar dele, mas sugere alguns palpites. “Você anda no Centro e vê um lugar histórico abandonado, com gente de rua morando dentro”.

Leonildo narra como é manter tudo em ordem. Ele chega na propriedade às 7 horas da manhã. A primeira tarefa é varrer a parte da frente da residência. Em seguida, ele poda os muros, que são cobertos por cercas vivas, e corta a grama, que cobre grande parte do terreno. “Eu mantenho esse sentido da limpeza, para quem passa aí na frente ver que tá tudo em paz”.

Já sobre a preservação do espaço, ele explica onde estão os esforços. “Eu preservo duas coisas aqui, por mim e pela pessoa do Antonio que foi embora. Eu fiquei com uma responsabilidade muito grande que é cuidar deste patrimônio histórico”.

Na frente do conjunto, há algumas pedras na calçada. Leonildo explica que elas foram colocadas pelo próprio Antonio. Nelas, alguns vizinhos sentavam e ali formava-se conversas descontraídas. Em outros espaços, logo na entrada, Leo relembra a vez em que o Toninho realizou uma escavação, ao plantar uma árvore, e encontrou um pedaço de muro. 

Embora tenha orgulho de trabalhar no conjunto histórico, ele afirma que nem tudo na tulha é bonito. “A história daqui, por exemplo. Aqui teve muito sofrimento. Na época antiga, o povo que trabalhava aqui não recebia. Muita gente apanhou aqui”. Leonildo faz referência aos antigos escravos da era dos engenhos.

No terreno de mais de dois séculos, há algumas lendas e superstições. Segundo o jardineiro, os antigos guardavam objetos em potes de barro e enterravam. Em diversas oportunidades, ele diz que já ajudou a cavar com o patrão em busca de itens com valor histórico. “Uma vez, o Toninho encontrou um muro de pedra. Quando você entra ali, pode ver um muro. Ele que encontrou”. Sobre a importância do lugar para Campinas, Leonildo afirma:

“A história da cidade está aqui dentro”.

Vozes da Nossa Gente

Essa matéria faz parte do Projeto “Vozes da Nossa Gente”, que tem como foco no jornalismo hiperlocal e busca uma maior conexão com a comunidade. O “Vozes da Nossa Gente” pretende inspirar com boas histórias, que são contadas de maneira humanizada pelos moradores de dez bairros da cidade.

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  • Conteúdos interativos, que serão postados nas redes sociais do portal
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