A defesa do tratamento precoce contra Covid-19 gerou discussão entre vereadores na sessão desta terça-feira (23) na Câmara Municipal de São Carlos. Epidemiologista alerta para os riscos e a falta de comprovação científica dos medicamentos do chamado “kit Covid” (veja abaixo).
Presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal, Lucão Fernandes (MDB) iniciou o debate sobre o assunto e disse a cidade deveria avançar nessa questão do tratamento precoce. “Médicos renomados estão chamando a responsabilidade para adotar esse procedimento (…). Segundo relatos desses médicos, se não entrar com esse tratamento rápido, a doença evolui muito. Esses medicamentos, principalmente a ivermectina, funcionam como um bloqueador, não permitem a evolução”, afirmou.
Membro da Comissão de Saúde, o vereador Sergio Rocha (PTB) também defendeu o tratamento precoce e disse que “o que não mata engorda”. “Eu acho que demorou para levantar essa bandeira. Eu sempre defendi o tratamento precoce (…). Eu acho que está no momento de colocar esses medicamentos para a população de São Carlos”.
“Testou positivo já dá o medicamento para a pessoa. Não custa. O que não mata engorda. Nunca ouvi falar que esse medicamento matou alguém”, complementou.
O tratamento precoce também recebeu apoio dos seguintes vereadores: Marquinho Amaral (PSDB), Moisés Lazarine (PSL), Cidinha do Oncológico e Malabim (PTB).
Contraponto
A vereadora Raquel Auxiliadora (PT) se posicionou contra o tratamento precoce e afirmou os parlamentares deveriam estar pressionando o prefeito por lockdown e medidas concretas no combate à pandemia. “A gente está numa guerra, se as pessoas ainda não entenderam, e ao invés de a gente estar pressionando por medidas concretas dessa gestão, a proposta é kit covid, tratamento precoce”.
“Fila de espera de 7 horas para ser atendido, pessoas morrendo esperando por vaga de internação, pessoas morrendo por não ter vaga na UTI. Hemorragias, insuficiências renais, hepatite, arritmias e até a necessidade de transplante de fígado causado pelo tal tratamento precoce, que já foi comprovado cientificamente que não funciona. Isso é um genocídio, se ainda não entenderam”, complementou Raquel.
Ex-presidente da Comissão de Saúde, o vereador Elton Carvalho (Republicanos) disse que os vereadores deveriam estar preocupados com a falta de médicos na cidade. “Hoje eu fui no Centro de Triagem e tinha um médico, que é o doutor João, que é o proprietário da OMESC [Organização Social de Medicina e Educação de São Carlos]. Sabe por quê? Porque o contrato com a OMESC está pagando R$ 999 para um plantão de 12 horas. Em Araraquara está pagando R$ 2,1 mil. Tem que mudar o aditamento desse contrato com a OMESC. A gente precisa aumentar esse valor pago para o médico”.
Djalma Nery (PSOL) disse que o partido dele vem se mobilizando em todo o Brasil contra o tratamento precoce. Além disso, afirmou que existem estudos em todo mundo demonstrando que esses medicamentos ainda não tiveram a eficácia comprovada. “Ainda não existem evidências comprovatórias de que tratamentos precoces são viáveis. Um vereador que me antecedeu disse que o que não mata engorda. Mas tem coisas que matam, vereador. Tratamentos precoces têm matado pessoas, tem colocado pessoas na fila de transplante. Então não é uma coisa inofensiva”.
Epidemiologista alerta para riscos do “kit Covid” e falta de eficácia
Médico epidemiologista e professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Bernardino Alves Souto disse que os medicamentos do chamado “kit Covid” não tem eficácia contra a doença. “Já está provado cientificamente, por vários estudos feitos no mundo, que ivermectina, cloroquina, azitromicina, vitaminas, nada disso tem benefício para tratamento precoce contra Covid-19 ou para prevenir a Covid-19”.
Souto também alertou para os riscos do uso desses remédios. “Esses medicamentos podem fazer mal para as pessoas, especialmente numa indicação para a qual eles não têm eficácia. Então o risco-benefício não vale a pena. Já existe a comprovação científica da ineficácia desses medicamentos no tratamento precoce da Covid-19. Desse modo, não se recomenda para ninguém a fazer uso desse tipo de tratamento. Se de fato isso funcionasse, o mundo inteiro já estava usando isso”.
Prefeitura diz que não vai comprar “kit Covid”
Procurada, a Prefeitura de São Carlos informou que, quanto ao tratamento precoce, a Secretaria de Saúde entende ser um critério médico, uma prrogativa do médico. Além disso, afirmou que o município não tem como adquirir kits de tratamento para COVID-19, pois não é validado pela Anvisa, porém alguns desses medicamentos já são disponibilizados pelo SUS para tratamentos de outras doenças.
Em relação ao questionamento sobre a falta de médicos e o pagamento feito aos plantonista, a prefeitura informou que a OMESC foi contratada por meio de um chamento público, no qual venceu porque apresentou o menor valor e por lei o município tem que julgar vencedor da licitação quem apresenta o menor preço. Pelo contrato, o plantão de 12h sai para a Prefeitura por R$ 1.264,00.