9 de maio de 2024
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O que te assombra

Ao mestre com carinho, uma homenagem a José Mojica Marins

Homem, que materializou a imagem do terror em seu personagem Zé do Caixão, faria 88 anos nesta quarta-feira (13)

José Mojica Marins deu vida a Zé do Caixão (Foto: Thiago de Souza)

*Por Thiago de Souza

No dia 13 de março de 1936, na Cidade de São Paulo, nascia um dos maiores gênios da Cultura Nacional, referência máxima em um segmento cinematográfico muito particular.

José Mojica Marins, filho de Antonio André Marins e Carmem Mojica Imperial, ainda na primeira infância teve contato com a leitura e por teatro de bonecos, mas o que foi definitvo para o seu destino foi a oportunidade de viver com sua família, em uma casa nos fundos do cinema em que seu pai trabalhou como projetista e gerente.

O acesso aos filmes despertou uma paixão imensurável, que alcançou outra proporção quando Mojica ganhou, aos 12 anos, sua primeira câmera. O resto é história acontecendo.

Mojica fundou uma escola de atores, uma companhia cinematográfica e começou a se movimentar no universo da sétima arte, já com credenciais de autor, dramaturgo, roteirista, diretor e, claro, ator. O futuro ainda lhe reservaria mais duas competências: apresentador e entrevistador.

Mas seus primeiros filmes, diferente do que se pode imaginar, não foram do gênero Terror. Passando por várias “escolas” de estilos cinematográficas. Seu primeiro trabalho, que nunca foi concluído, tem contornos religiosos, e sua primeira obra integral foi um filme de Aventura chamado “A Sina do Aventureiro”.

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O encontro com o Terror

Mais tarde, no ano de 1964, José desfilou seu talento em sua primeira obra do gênero Terror: “A meia noite levarei sua alma”!

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Esse também é o filme de estreia do seu “parceiro da vida”, Josefel Zanatas, mundialmente conhecido como… ZÉ DO CAIXÃO!

Sim, o Zé do Caixão, personagem, tem um nome de RG. Embora o filme seja de 1964, não darei spoiler, mas posso dizer que a Zanatas é dada uma trilogia com mais dois filmes: “Essa Noite encarnarei o seu cadáver”, de 1967, e “O despertar da Besta ou Ritual dos Sádicos”, de 1969.

O último foi censurado pela ditadura militar, pois, segundo os censores, era subversivo e infame, opinião bem diferente da emanada pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema, que credita, à obra, a condição de figurar entre os 100 melhores filmes brasileiros de todos os tempos.

Embora esse texto seja uma singela homenagem de um fã apaixonado ao Sr. José Mojica Marins, é difícil não relacionar homem e obra, especialmente quando a obra se trata da figura que materializou o arquétipo macabro mais conhecido dessa terra cheia de medos, chamada Brasil.

Zé do Caixão

Zé do Caixão não é apenas um personagem de filmes que saiu da tela para profetizar maldições e rogar pragas pelo mundo. Seu primeiro papel de protagonista na vida de José Mojica foi em um sonho, ou melhor, em um pesadelo.

Mojica era arrastado em um cemitério, por um homem de capa preta, unhas enormes, cartola escura, em meio a gargalhadas cruéis. Ao chegarem em uma sepultura, a perversa entidade ergueu a cabeça de Mojica, que lutou contra, e tentou mostrar a ele a data de sua morte.

O cineasta despertou do pesadelo aos gritos, assustando a casa inteira. No dia seguinte, seus familiares, impactados com o ocorrido, convocaram um pai de santo para espantar aquela figura, mas ela se tornou companhia de Mojica para todo sempre.

Zé do Caixão virou mais do que um alter ego do cineasta, um escudo contra seus medos. Eu acredito que, por Mojica ter dado vida ao Zé do Caixão, Zé do Caixão deu o estrelato a Mojica.

No exterior, Zé do Caixão é chamado de Coffin Joe (Foto: Reprodução)

Conquistando o mundo

A competência de Mojica aliada à sua fenomenal genialidade, deram a Zé do Caixão a potência de atravessar as telas dos nossos cinemas e conquistar o mundo, ganhando até um apelido em versão inglesa: Coffin Joe.

Há inclusive um projeto internacional em andamento, chamado “Zé do Caixão”, produzido por Ellijah Wood, protagonista de Senhor dos Anéis.

Descanso eterno

E para fechar a tampa do caixão, outro tema dessa conversa são as homenagens no local de descanso eterno do nosso mestre. Para quem não sabe, sou um necroturista e promotor de experiências púbicas em cemitérios. Em uma dessas andanças, me deparei com a sepultura do mestre José Mojica Marins. Esse encontro também ajudou a mudar meu olhar sobre esse território tão rico e delicado, mas muito incompreendido.

Mojica, antes de sua derradeira despedida física, escolheu ser sepultado no mesmo local de Dona Carmem, sua mãe. O terreno não era de propriedade de sua família, pois Mojica passava por um momento econômico delicado quando perdeu sua matriarca. Ele recebeu de amigos da família a autorização de enterrar sua amada mãe em um local digno.

Muitos fãs de ocasião começaram a julgar as condições do local, inclusive tendo, um destes, provavelmente, raspado a denominação “Zé do Caixão” que estava em cima da sepultura.

Acredito que cemitério não seja lugar de julgamentos e defendi publicamente a presença de espírito da família de Mojica em não intervir na vontade de seu patriarca (mais ainda por se tratar de uma campa que não os pertencia), mas não posso esconder a felicidade de ver o local restaurado e, mais ainda, por compreender as nuances da homenagem que hoje se posta diante de toda Necrópole São Paulo.

A primeira delas, diz respeito a absoluta rejeição de Mojica à Morte. Ele nunca gostou dela. Ele era apaixonado pela vida e qualquer homenagem que fosse feita ao ser humano, teria que ter esse caráter.

Segundo, que é muito importante diferenciar o homem do personagem. Zé do Caixão, embora esteja sempre pulsante nos oráculos do horror, jamais sobreporá seu criador, que merece ser lembrado como filho, pai, avô, amor, mestre generoso, majestade no infinito universo da cultura brasileira, que continuará inspirando gerações com sua genialidade!

Jazigo onde José Mojica Marins descansa (Foto: Thiago de Souza)

Inspiração

Hoje tenho um projeto que lida com emoções decorrentes de medos, muitos circunscritos pelo imaginário popular, muitos internalizados em minhas próprias incertezas e inseguranças.

Muitas são as inspirações do projeto “O que te assombra?”, mas, nenhuma delas perfaz seu tema central com tanta propriedade como a figura deste gênio, que tive a oportunidade de ver e ouvir, durante o período em que José Mojica Marins gravava “O Estranho Mundo de Zé Caixão”, nos anos 2000, em um estúdio no Bairro do Alto da Lapa, na Zona Oeste de São Paulo.

Viva José Mojica Marins e seus pulsantes 88 anos de existência física e cósmica!

Quem é Thiago de Souza?

Thiago de Souza é compositor, roteirista e humorista, fundador do grupo “Os Marcheiros” e idealizador do projeto “O que te Assombra?”. Ele também é o criador do programa de políticas públicas para preservação de patrimônio material e imaterial chamado “saudade e suas vozes” já implementado nas Cidades de Campinas e Piracicaba.

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