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Lazer e culturaZinho e Mitsuko: a longevidade de negócios passados por gerações em Araraquara

Zinho e Mitsuko: a longevidade de negócios passados por gerações em Araraquara

De pai para filho, avô para neto, patroa para funcionário; conheça a história de um bar e uma floricultura que resistem ao tempo sustentadas pelo carinho e afeto

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ESPECIAL DE ANIVERSÁRIO

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Aos 29 anos, João Colturato, o Zinho, tinha um caminhão e um sonho. O primeiro, que usava para carregar tijolos, ele vendeu, mas o segundo vive e respira há 69 anos: o famoso Bar do Zinho, inaugurado em 1954.

A escolha foi certeira. Junto com o bar vieram amigos, família, filhos. “A minha infância inteira foi nesta praça [das Bandeiras, no Centro]. Eu ficava correndo no meio dos clientes, correndo dentro do bar”, disse Francisco Colturato, de 59 anos, filho do fundador e atual dono do bar.

Bar do Zinho em Araraquara (Foto: Raquel Baes/acidade on)

Em 1993, quando o pai já estava com 67 anos, ‘Fran’, como ficou conhecido, assumiu o negócio da família. “Foi de um dia para o outro, de deitar, acordar com a ideia de vir para o bar e falar: ‘ Olha, papai! É hora do senhor começar a se afastar e eu vou assumir'”, lembrou.

Quase como um personagem, o bar que está prestes a completar 70 anos tem muito história para contar. Suas memórias estão espalhadas no imaginário dos funcionários, da fiel clientela e registradas em fotografias que mostram a passagem de tempo.

Mural guarda lembranças de fregueses e funcionários ali. Na foto, Zinho e um amigo. (Foto: Raquel Baes/acidade on)

O lugar já foi ponto encontro das principais figuras políticas de Araraquara, incluindo Waldemar De Santi, que foi prefeito da cidade por três mandatos, em 1976, 1989 e 1997.

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“O reservado [salão], chegou a ser chamado de Senazinho. O prefeito Waldemar de Santi frequentava, vários vereadores da cidade também.”

Decisões foram tomadas ali, nos fundos do bar. “A Seresta a Caminho do Sol, nasceu aqui em um bate-papo informal, entre uma reunião do De Santi”, contou Fran.

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DA VELHA GUARDA PARA A ERA DOS CABELUDOS

O saudosismo e a simplicidade fazem parte do cenário do local. Talvez, o segredo do sucesso e décadas de resistência esteja nas impressões que o espaço provoca na freguesia.

Como em uma metamorfose, o público também foi se transformando. Os sons dos discos de Nelson Gonçalves, Altemar Dutra, Altamiro Carrilho passaram a dar lugar para as notas pesadas das guitarras de Queen e Led Zeppellin. 

Por causa da cerveja barata, os roqueiros começaram a “brotar” da praça e a “colar” em peso no Zinho. “O advento dos cabeludos! Em princípio tive muito medo de haver um choque entre a velha guarda e os cabeludos. Que nada, a velha guarda aceitou de um jeito muito bacana […]. Fui conhecendo um a um e, hoje, são os filhos deles que frequentam o bar”, disse Fran.

NAQUELA MESA TÁ FALTANDO ELE

Mesmo com a idade avançada, Zinho não deixava de aparecer no bar. “Ele tinha a função social, sentava na mureta, conversava com os mais novos. Ele respirava bar. A minha mãe está com 90 anos e, até hoje, ela pergunta como está o bar. Eles viveram a vida toda aqui”, relembrou.  

No dia 10 de julho de 2013, Zinho faleceu. Mas, como diria Nelson Gonçalves, ‘Naquela mesa’ ficou faltando ele, mas seu sonho continuou presente.

Fran (ao centro) e seu filho Lucas (à dir) olham para o quadro de Zinho na parede (Foto: Raquel Baes/acidade on)

Primeiro, de pai para filho, e depois de avô para neto. Quem se prepara para carregar a tradição, joia rara da família, é Lucas Colturato, de 37, que há pelo menos 19 anos trabalha oficialmente nos negócios dos Colturato.

“Quando entrei na faculdade, estudava de manhã e trabalhava no bar à tarde. Quando me formei, continuei trabalhando no bar e na minha profissão de educador físico também, querendo que a tradição continue”, contou.

 “Tinha uma amizade muito forte com meu avô, aprendi muito com ele, não só aqui, mas fora do bar. Um cara muito família, a casa dele sempre estava cheia. Isso é um ponto muito forte que sustenta tudo isso”, concluiu o neto.

Simplicidade e nostalgia fazem parte da atmosfera (Foto: Raquel Baes/acidade on)
UMA HISTÓRIA DE AMOR E CONFIANÇA

Localizada atualmente na Rua Gonçalves Dias (R.1), no Centro, a Mitsuko é uma das mais antigas e tradicionais floriculturas de Araraquara. Quem passa pela vitrine enfeitada com ursos de pelúcia, orquídeas, rosas e cartões de presente, não imagina o segredo dos 55 anos deste lugar.

A floricultura nasceu em 1968, na Avenida José Bonifácio. Na época, a proprietária era Mitsuko Nakasone, que havia seguido os passos da mãe, que tinha uma quitanda de flores e frutas no Mercado Municipal de Araraquara, desde 1959.

O tempo era diferente, a cidade estava crescendo e as pessoas chegando. “Então onde eu trabalhava, todas as esquinas começaram a abrir floriculturas”, relembrou Mitsuko, hoje, com 82 anos e muita vitalidade.

Flores vinham no trem em caixas de papelão (Foto: Raquel Baes/acidade on)

Em muitas histórias, a hereditariedade está atrelada a herança das responsabilidades nos negócios. Este não é o caso da Mitsuko. Ali, as histórias se baseiam em confiança.

Atrás do balcão, um simpático senhor de bigodes grisalhos se orgulha de trabalhar na floricultura desde os 11 anos. Júlio Fávero Piza, 63, entrou para equipe ainda menino, em 1971. Na época, ele conciliava os estudos com o trabalho.

“Eu lembro que eu ia buscar as flores na estação de trem, porque as rosas vinham por trem, em caixas de papelão. Pegava a na estação e levava no mercado municipal”, relembrou Júlio.

Hoje, mais de 30 anos depois, ele se tornou o dono da Mitsuko. “É prazeroso agradar as pessoas, mostrar o sentimento. A gente é a ponte entre essas situações. A gente não vende flores, vende emoções. É preciso gostar muita da profissão, porque se trabalha muito. Tem que ter a noção que a flor é um produto frágil. O pessoal acha que é um serviço leve. Mas não é, é trabalhoso”, disse Piza.

Para Júlio, trabalhar com flores é trabalhar com emoções (Foto: Raquel Baes/acidade on)

Após anos de aprendizados, em 1985, ele decidiu abrir a própria floricultura. No entanto, não queria deixar a tradição de lado. Pediu à patroa, na época, a permissão para carregar consigo o nome dela e do lugar que tanto lhe ensinou.

O elo da dupla era forte e Mitsuko autorizou que Júlio continuasse o legado. “Merece, não é? Merece quando a gente gosta, quando o pessoal é bom, não tem outra coisa, se não dar o nome”, afirmou Mitsuko.

Ela continuou com sua floricultura até se aposentar, no início dos anos 2000, mas nunca deixou de lado o amor pelo que construiu, ajudando assim o ex-funcionário. “Disse: ‘agora vou ser funcionária de vocês, vou ajudar no que for possível’”, lembrou.

Antes da pandemia, ela frequentava a loja de Júlio todos os dias. Contudo, por causa de problemas de saúde precisou desacelerar, mas ainda é frequente a sua gargalhada nos fundos da loja.

Júlio (à esqr.), Mitsuko (ao Centro) e Rafael, filho de Júlio (à dir.) se consideram uma família (Foto: Raquel Baes/acidadeon)

De patroa e funcionário, eles construíram uma linda amizade, viraram família, mesmo sem laços de sangue. Hoje, inclusive, Mitsuko mora com a filha de Júlio e a trata como uma neta.

“O que eles tem de carinho, por mim eu fico emocionada de pensar o quanto eu sou amada por eles”, afirmou Mitsuko emocionada com lágrimas nos olhos.

SEM DATA PARA ACABAR

A essência da floricultura não deve acabar tão cedo. Criado desde pequeno no meio das rosas e girassóis, o empresário Rafael Fávero Piza, 38, herdou o dom e a garra do pai. Há pouco menos de um ano, ele abriu outra floricultura Mitsuko.

“São 24 anos trabalhando com floricultura, eu comecei com 14. É algo que te prende, acho um ramo, que tem bons ventos soprando sempre”, disse Rafael.

Sobre sua escolha de continuar o legado construído por Mitsuko e seu pai, ele respondeu: “Ela plantou coisas maravilhosas, nos deixa muito feliz, lisonjeado, por ela ceder o nome dela para levarmos com a gente, é algo extraordinário”, finalizou o empresário.

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Raquel Baes
Raquel Baeshttps://www.acidadeon.com/araraquara/
Raquel Baes é formada em Jornalismo pela Universidade de Araraquara (Uniara) desde 2018. Passou pelas redações do Portal g1, EPTV Central e atualmente escreve para a editoria de Lazer e Cultura do acidade on Araraquara
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